Saudades



1 colheradas
Bateu-me à porta a chorar, as lágrimas reluziam com a luz da entrada, a gota estava a chegar ao canto da boca, não nos víamos há demasiado tempo. Com o meu polegar afastei a lágrima do canto da boca, passei a mão pela cara, pela pele que não sentia o que parecia ter sido uma eternidade, pelos cabelos que passaram pelos meus dedos como as lágrimas que lhe caíam pela cara. Agarrei-lhe a nuca e beijámo-nos. Os segundos passaram tão devagar como o tempo passou sem eu a ver. Mordi-lhe gentilmente o lábio superior e limpei-lhe as lágrimas com beijos.
Não dissémos nada, não era preciso, nunca foi. Enquanto passava os meus lábios nos dela, a minha mão esquerda agarrou-lhe a cintura e encostei-a à parede. “Desculpa” saiu-lhe da boca em tons de “Amo-te”. Não respondi, encostei a minha testa à dela, sorri como quem sorri quando ganha razão passado muito tempo, um sorriso feliz pintado de ironia.
Peguei na mão dela, branca e pequena e indiquei o caminho para o meu quarto, ela já o sabia de cor.
Fechei e tranquei.
Olhei-a nos olhos, já não choravam. Nos olhos via amor, na boca uma lúxuria misturada com o sorriso de uma criança inocentemente feliz.
Agarrei-a com a mão direita a cintura, com a esquerda desapertava-lhe o casaco. Tirou um braço, sem muito esforço o outro. Sem o casaco empurrou-me para a cama, sentei-me a ver o que pensava ser um sonho do qual não pretendia nunca acordar.
Ela olhou para o quarto, tentando lembrar a vida que um dia foi dela e passou por ali. Olhou para a parede e viu que o que tinha sido uma oferenda dela para mim, um vinyl que ainda hoje está pendurado à parede do meu quarto e sorriu de novo. Não a tinha esquecido, todo o quarto era dela, o seu reino, a rainha que tinha um rei de joelhos a oferecer-lhe tudo. Do vinyl, os seus olhos amarelos escuros e os lábios rosas, quentes, molhados de saliva e secos do frio viraram-se para mim. Estava prestes a tornar-se no animal sedento de carne que eu tenho saudades.
Sempre com os olhos postos no meus, como quem tem milhares de conversas ao mesmo tempo, como quem me pede desculpas que eu aceito, sabendo que não o devia, como quem me explica porquê, dizemos um ao outro, só com os olhos que não temos futuro. Não vamos falar, não vamos estragar tudo e racionalizar as nossas escolhas. Olha-me nos olhos, beija-me.
Empurrou-me como quem manda deitar, o joelho direito entre as minhas pernas, beija-me os lábios, as linguas abraçam-se com saudades, morde-me a orelha, beija-me o pescoço. Já estava sem camisa quando lhe peguei para ser eu agora a abraçar a lingua dela, beijar-lhe a orelha, morder o pescoço, ajudá-la a levantar os braços para tirar do caminho a camisola, o top de alçinhas que não era novo, azul violeta, a cor favorita dela.
Saí de cima dela para me por de pé e desajeitadamente tirar os sapatos e as meias, ela aproveitou a deixa, sentou-se para tirar as meias e descalçar os sapatos, muito mais delicadamente do que eu. Depois puxou-me para si, beijava-me o peito e desapertava-me o cinto, tirou-me as calças. Durante uns segundos beijou-me os boxers, eu mordia os lábios a pensar nos dela. Segurei-lhe o cabelo com autoridade e empurrei-a para a cama. Tirei-lhe o cinto, puxei-lhe as calças. Tirei-lhe as cuecas e abri-lhe as pernas. Que saudades. Beijei-lhe a bexiga, beijei-lhe o umbigo, beijei-lhe o peito, entre os peitos, beijei-lhe o pescoço e mordia-lhe os lábios enquanto o soutien saía de cena. Eu não merecia aquele corpo, ela não merecia o meu ser. Calados, não estraguemos o nosso amor e as nossas saudades, as felicidades e as tristezas a racionalizar. Não racionalizemos a paixão ardente que temos um pelo outro. Beijei-lhe os seios, a mão deslizava pelo corpo até encontrar o que queria, o que precisava. Começou a gemer. Agarrou-me nos cabelos como se estivesse a cair, começou a gritar, a contorcer-se. Voltei à boca, Fechei a luz.

1 colheradas:

Cristina Milho at: 6 de dezembro de 2012 às 00:15 disse...

ou de como se salvam coisas da memória :) gosto!

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