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Quando o telefone tocou às 2.32, já sabia o que a voz do outro lado me iria anunciar: mais um crime na cidade vizinha de Castelo Novo. Não posso dizer que me tenham acordado: o sono é um privilégio que raras vezes me é concedido. Então era eu a escolhida para investigar a morte da terceira funcionária da fábrica Conserva, após dois casos não resolvidos? Deviam estar desesperados para me telefonarem depois de praticamente me terem despromovido a secretária. Se eu fosse apenas orgulho, teria recusado; mas também fui curiosidade e vontade de ver justiça feita.
            Local? O mesmo dos crimes anteriores, o baldio atrás da fábrica. O modus operandi? Sempre diferente. Desta feita, asfixia. O Agente Costa farejou-me antes de eu o ver. Fora ele a encontrar o corpo.
            – Só pode ser o mesmo gajo! Arrancou outra vez os dentes e rapou-lhe o cabelo.
            – Como sabes que é um homem?
            – Só pode! Esta brutalidade é... Só pode vir de um homem!
            – Costa, pelos vistos ainda não sabes do que uma mulher é capaz. Mas conta-me mais.
            Nada surpreendentemente, o Costa pouco mais sabia. Mas o técnico Fonseca chamou a minha atenção para algo interessante: em cima do peito da mulher, estava meia tarântula. Corte limpo.
            Era uma noite fria, demasiado fria para o impermeável leve que eu vestia. Enquanto esperava a chegada do administrador, pensei: uma tarântula pode ser uma marca, um código. Mas meia tarântula é um aviso.
            – Boa noite, Sr. Marques. Lamento incomodá-lo a estas desoras.
            – Ora essa. É uma tragédia.
            – De facto – respondi. – Acha que podemos dar uma vista de olhos à sua colecção de aranhas?

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